sábado, 20 de setembro de 2008

Semana Ousada na mídia

Pode ir - Eventos - Semana Ousada de Artes UFSC – UDESC

Pode ir - Eventos - Arrigo Barnabé e Tetê Espíndola

FloripaNews - Cultura - Exposição "O Cinza e a Cor" traz obras inéditas de José Maria Dias da Cruz a partir de 23/9 em Florianópolis

FloripaNews - Cultura - Abertas inscrições para oficinas da 1ª Semana Ousada de Artes UFSC-Udesc

"Jango em três atos", de Deraldo Goulart

A Mostra de Cinema da Semana Ousada de Artes UFSC-UDESC apresenta:

Jango em três atos” (TV Senado/Instituto João Goulart), documentário de Deraldo Goulart
23/09 (terça-feira), às 14h, no Auditório da Reitoria da UFSC (às 16h, haverá um debate com João Vicente Goulart e Deraldo Goulart no mesmo local)

Release - Jango foi envenenado a pedido do governo brasileiro, diz ex-agente secreto uruguaio

O ex-agente do serviço secreto do Uruguai, Mario Neira Barreiro espionou durante quatro anos a família de João Goulart no exílio. Em encontro emocionante com João Vicente, filho de Jango, ele revela a Operação Escorpião, criada pelo serviço de inteligência uruguaio para controlar os passos dos exilados.

Eleito vice-presidente em 1960, Jango soube da renúncia de Jânio Quadros quando estava em visita a China. Em documento exclusivo só agora revelado, o primeiro presidente parlamentarista do Brasil, diz que a saída de Jânio foi o momento mais dramático da vida dele. Acusado de comunista foi deposto pelo regime militar em 1964.

A morte de Jango ainda desperta a curiosidade dos brasileiros. Oficialmente a causa foi um ataque cardíaco. Não foi feita autópsia do corpo nem no Brasil nem na Argentina. Em carta enviada aos filhos que moravam em Londres, na Inglaterra, divulgada pela primeira vez, Jango avisa que tem medo de morrer.No filme, o ex-agente do serviço secreto uruguaio diz que Jango foi morto a pedido do governo brasileiro. Segundo Mário Neira Barreiro o ex-presidente teria sido envenenado com um comprimido colocado dentro dos remédios controlados que Jango tomava para problemas cardíacos.

Mário Neira Barreiro, está preso desde 2003, na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas, no Rio Grande do Sul, acusado de assalto a banco cometido em solo gaúcho. O detento é parte de uma grande trama ainda em investigção por parte da familia e do Ministerio Público Federal.Com base em farta documentação liberada recentemente pelo governo federal, grande esforço de pesquisa e produção a TV Senado produziu o documentário Jango em 3 Atos. O filme mostra a vida, o governo e o exílio no Uruguai e Argentina. Apresenta depoimentos que mostram como as ditaduras agiram de modo coordenado na América do Sul.

Jango morreu em seis de dezembro de 1976, em Mercedes, na Argentina. Foi sepultado na cidade gaúcha de São Borja, onde nasceu. O trabalho cinematográfico tem direção de Deraldo Goulart que também dirigiu os documentários Niemeyer por Niemeyer, O Tempo de Erico e Getúlio do Brasil. A produção de Jango em 3 Atos contou com o apoio do Instituto Presidente Goulart com a cessão de documentos e fotos do acervo da família.

“Alva paixão”, de Maria Emília de Azevedo

A Mostra de Cinema da Semana Ousada de Artes UFSC-UDESC apresenta:
“Alva paixão”, de Maria Emília de Azevedo
Ficção / 18 min / 35mm / cor / 1995

Sinopse:
João da Cruz e Sousa, tísico e cansado, envelhecido precocemente, diante de Nestor Vítor remete-se a lembranças. As recordações são marcadas pelo dilema entre o equilíbrio que representa o alvo e a paixão soprada da África. O flash back interrompe em contraponto ao denso desabafo do poeta. Sentindo a morte, João confia ao amigo simbolista os últimos sonetos produzidos, que seriam publicados postumamente em Paris.
Ficha técnica:
Direção: Maria Emília de Azevedo
Elenco: Robson Benta, Zezé Motta
Roteiro: Maria Emília de Azevedo
Fotografia: Rodolfo Ancona Lopes
Assistência de Fotografia: Charles Cesconetto
Som: Renato Calaça
Edição de Som: Máximo Barro
Música: Alexandre Prade
Montagem: Máximo Barro
Produção: Jair dos Santos
Produtora: Via Sul Produções

"Cruz e Sousa - A Volta de Um Desterrado"

A Mostra de Cinema da Semana Ousada de Artes UFSC-UDESC apresenta:



"Cruz e Sousa, a volta de um desterrado" de Cláudia Cárdenas e Rafael Schllchting;

25/09 (quinta-feira), às 10h30
Local: Auditório da Reitoria - UFSC

Sobre a exposição do Zé Maria - Artigo de Salim Miguel

Os florianopolitanos podem agora admirar, no hall da reitoria da Universidade Federal de Santa Catarina, promoção DAC-UFSC, a exposição de um importante pintor contemporâneo brasileiro José Maria Dias da Cruz, ou, para os amigos, Zé Maria, que tem um fato insólito a ligá-lo à então bela e pacata cidadezinha dos anos 40. Vejamos qual:

Há exatos sessenta anos acontecia, no pátio coberto do Grupo Escolar Dias Velho – Rua Saldanha Marinho, esquina com Victor Meirelles –, a abertura da exposição de Arte Contemporânea trazida por Marques Rebelo, graças a contato dele e de Flávio de Aquino com o Secretário de Educação do Estado, Armando Simone Pereira, e o imprescindível apoio da “turma da revista Sul” (in carta de Rebelo a Aníbal Nunes Pires). Antes da abertura, devido à divulgação pela imprensa, já a cidade se dividia entre os que abominavam “aquelas coisas” e os que adoravam aquelas mesmas coisas, embora ambos os grupos só tivessem visto reproduções. A exposição só fez ampliar a polêmica, que se tornou mais acirrada com as três palestras de Rebelo, misto de erudição e irreverência, no próprio local e que durante dias foram motivo de bate-boca nas ruas da capital catarinense.

Marques Rebelo já havia realizado exposições semelhantes em Resende - RJ, Cataguases – MG, e Buenos Aires, sempre com sucesso. Não foi diferente em Florianópolis. Não demora ele, mais para baixo, magro, elétrico, conversador, estava freqüentando o café Rio Branco, o Poema Bar, o Miramar, o restaurante Pérola, e, principalmente, os bancos da figueira da Praça XV.

Pela primeira vez, podíamos ver, entre outros, originais de Portinari, Di Cavalcanti, Pancetti, Djanira, Iberê Camargo, além de reproduções de pintores de vários países, e, “fato insólito”, trabalhos de dois rapazolas na faixa dos 10 anos, o parisiense-florianopolitano Rodrigo de Haro e o carioca José Maria Dias da Cruz. Em Florianópolis, uma das primeiras visitas de Rebelo foi a Martinho de Haro, por ele considerado um dos mais importantes pintores modernos brasileiros; na ocasião se deparou com desenhos do Rodrigo e resolveu expô-los ao lado dos de Zé Maria. Na exposição similar em Belo Horizonte, lá estavam de novo os dois.

Resultado direto da exposição, foi criado o Museu de Arte Moderna de Florianópolis, com um pequeno acervo, logo acrescido de trabalhos de pintores paulistas doados pelo governador Ademar de Barros. Em 1949, o museu foi oficializado por decreto do governador Aderbal Ramos da Silva, e nos anos 60 se transformou no MASC, hoje com um considerável acervo. Marques Rebelo sempre incentivou o crescimento do museu.

O autor de A estrela sobe morto antes de completar 70 anos, sem ver concluído seu ambicioso projeto do romance cíclico O Espelho Partido, do qual apenas 3 dos 7 volumes foram publicados, não teve também como ver a trajetória ascendente e a importância que hoje Zé Maria tem para a nossa pintura.

Tenho, de José Maria Dias da Cruz, um quadro dos anos 60, ele já um artista maduro; eterno insatisfeito, passou por várias fases; a exposição atual é quase toda ela constituída de quadros pintados na tumultuada Florianópolis de hoje. Ao falarmos de José Maria não podemos esquecer o professor renomado, que durante anos ensinou os segredos da pintura no Parque Lage/RJ. Pesquisador e estudioso, se detém sobre a vida e obra de grandes pintores, como por exemplo Cézanne.

Encerro com algo que já deveria ter explicitado: José Maria Dias da Cruz é filho de Edy Dias da Cruz. Alguém deve se perguntar ou me perguntar: e daí? É que Edy Dias da Cruz é nada mais nada menos do que Marques Rebelo, a quem devemos a criação do MASC e o encontro, pela primeira vez, com os mais importantes pintores brasileiros.

Salim Miguel

(publicado no caderno Cultura, do Diário Catarinense)

"Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro" - Fortuna crítica

"Como um branco, o branco mais branco que conheço, conseguiu fazer esse filme que vai tão fundo na dissecação da alma negra?"
Ruth de Souza (O Estado de S.Paulo).

“Visualmente rebuscado, graças à fotografia de Antonio Luiz Mendes, este mergulho na vida do poeta João da Cruz e Sousa, oferece ao espectador uma delicada aula sobre o simbolismo. Um dos melhores trabalhos de Back, o longo foi editado por Francisco Sérgio Moreira, um dos mais criativos montadores do país.”
Rodrigo Fonseca (O Globo)

"O diretor Sylvio Back optou pela fusão de elementos biográficos com a contínua leitura dramática de textos, criando talvez um gênero novo de cinema entre nós, apto a satisfazer as ânsias moderadas de ficção e de documentário."
Ivan Teixeira (Folha de S.Paulo)

"É, realmente, seu melhor filme, um dos mais belos do cinema bra¬sileiro recente."
Luiz Carlos Merten (O Estado de S.Paulo)

"Seu filme é ótimo, inovador na linguagem e absolutamente arreba¬tador. Eu adorei."
João Sampaio (A Tarde, @, Salvador/Bahia)

"O filme me tocou muito; acho que essa vontade de ir fundo na obra de Cruz e Sousa não é só artística; é uma coisa política, também, e eu acho que essa paixão falta no Brasil."
Zezé Motta (O Estado de S.Paulo)

"O filme de Sylvio Back atualiza a questão negra."
Anelito de Oliveira (Suplemento Literário de Minas Gerais)

"Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro é Sylvio Back com as veias abertas e o coração entregue."
Chuchi Silva (Diário Catarinense, Florianópolis/SC)

"Suas falas, simultaneamente teatrais, poéticas e cinematográficas, arrebatam os espectadores. Back usa o cinema como pretexto para demonstrar a habilidade em metaformosear-se em vários suportes distintos. É um cinema que agride pelo lirismo, dá porrada pela poesia."
Alécio Cunha (Hoje em Dia, Belo Horizonte/MG)

"Um exercício de sensibilidade poética."
Luiz Zanin Oricchio (O Estado de S.Paulo)

"Acho um filme admirável."
Alexei Bueno (Jornal do Brasil)

"Um dos grandes méritos do filme de Back é apontar de maneira comovente a luta de Cruz e Sousa contra a exclusão e o racismo e, ao mesmo tempo, reverenciar a cultura afro-brasileira através de rituais de candomblé, canto iorubá e o apoteótico final com uma escola de samba."
Carla Dórea Bartz (Sinopse Revista de Cinema, São Paulo)

"... uma exigente e personalíssima visão do poeta simbolista João da Cruz e Sousa."
Orlando Margarido (Gazeta Mercantil, São Paulo)

"É um filme de autoria, quase radical."
Paulo Camargo (Gazeta do Povo, Curitiba, PR)

"... uma fita essencialmente poética - em sua recusa dos paradigmas narrativos clássicos (negando a coerência em prol da emoção), em seu roteiro fragmentado, em sua encenação que não evita alegorias e metáforas visuais."
Marco Antonio Barbosa (Tribuna de Imprensa, Rio de Janeiro)

"Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro" é um filme que vai emocionar o público."
Sandra Almada (Raça, São Paulo/SP)

"Talvez a principal virtude de Back seja não facilitar a vida do espectador..."
Inácio Araújo (Folha de S.Paulo)

"O filme de Sylvio Back mostra isso: apesar do horror, o coração do homem ainda teima em sonhar e ser feliz."
Zeca Corrêa Leite (Folha do Paraná, Londrina/PR)

"Back continua ousado."
Eduardo Souza Lima (O Globo)

"Cruz e Sousa, de Sylvio Back é um filme luminoso."
Sérgio da Costa Ramos (Diário Catarinense, Florianópolis/SC)

"Libelo contra a discriminação racial, mas essencialmente uma metáfora sobre a tragédia do poeta e da poesia, o filme está impregnado de erotismo latente, por vezes explícito, da obra de Cruz e Sousa, traduzidos por uma fotografia que extrai o máximo da plasticidade de corpos se contorcendo em pulsação ora vital, ora agônica."
Régis Gonçalves (O Tempo, Belo Horizonte/MG)

"Cruz e Sousa é o visionário de uma realidade particularizada e Back, através do seu filme, torna essa particularidade do poeta ainda mais excêntrica e maravilhosa quando enfeixa no seu trabalho textos autobiográficos que remetem diretamente à experiência de vida de um dos mais extraordinários poetas da língua portuguesa de todos os tempos."
Uelinton Farias Alves (Suplemento Literário de Minas Gerais/MG)

"… you've made a film that levitates in the pure poetry of your director's eye! You, too, are going to deixar nome!"
Steven White (@, poeta e tradutor norte-americano)

"Quando Back apresentar seu filme e os atores descobrirem a névoa que oculta a poesia de Cruz, a platéia vai aplaudir de pé a obra dos dois poetas"
Zeca Pires (Ô Catarina, Florianópolis, SC)

"Sylvio Back, ele mesmo um poeta militante, procura dar ao embate cromático entre o claro e o escuro uma dinâmica que não se limita à denúncia do racismo ou do preconceito intelectual da elite branco a um escritor negro."
Ricardo Cota (Jornal do Brasil)

"Um passo de Armstrong foi dado nesse sentido pelo cineasta Sylvio Back em sua 'revisão' cinematográfica de Cruz e Sousa, cujo script se fundamenta em trechos da obra do poeta. À falta de TV, viva o cinema!"
Ivo Barroso (Palavra, Belo Horizonte/MG)

"O seu filme é um poema de alta voltagem. Estou ainda emocionado e perturbado e apaixonado e embriagado e menos burro e menos monstruoso."
Douglas Diegues (@, poeta, Ponta Porã/MS)

"O filme é uma aula de beleza. Em geral os excluídos são incorporados na nossa historiografia oficial também para serem atenuados. Nesse sentido, gostaria de reforçar que Cruz e Sousa é um filme necessário. O filme inclui a voz do poeta na atualidade."
Ivone Daré Rabello (Folha de S. Paulo)

“Inventor apasionado, el cineasta Sylvio Back apuesta a la sensualidad: la de las palabras y las imágenes, en primer lugar, pero también la de los cuerpos y los rostros, las miradas y los gestos, las posturas y los movimientos. El arte de Back – su mérito mayúsculo – está en su manera heterodoxa y resplandeciente de crear una erótica cinemato¬gráfica a partir de una poética literária.”
XIX Festival Cinematográfico del Uruguay

"No filme há um discurso articulado em torno da impossibilidade de crescimento e de projeção do artista em uma sociedade intolerante e arcaica. O que interessa a Back é esta luta (interna e externa) travada pelo artista para impor-se. Neste sentido, Cruz e Sousa é quase um diálogo a portas fechadas entre o poeta e o cineasta."
Luis Alberto Rocha Melo (P@anorâmica)

"Fiquei impressionadíssimo com o roteiro. Coisa de louco, siô! um filme que não tem "história" no sentido convencional do termo, mas que vai seguindo toda a lógica da construção dramatúrgica e tem clima e a gente chora no momento que precisa chorar e fica feliz (aquela felicidade possível) no final! Demais demais."
Carlos Roberto de Souza (@, diretor da Cinemateca Brasileira, São Paulo)

“Cara, o filme é belíssimo! A trilha é demais! E esses energúmenos falando de historietas americanóides... Você é extremamente corajoso e, acima de tudo, leal com você mesmo.”
Tanussi Cardoso (@, poeta, Rio de Janeiro)

“Ao tratar de um excluído, o poeta João da Cruz e Sousa, maior po¬eta negro da língua portuguesa, ele não apenas atualiza o discurso de Cruz, trazendo-o para o Brasil de hoje, Oferece, na prática um filme sobre o exílio, difícil, às vezes mal interpretado, mas cheio de lirismo – Back na vida real.”
Almir Feijó (em Descríticas, Edição do Autor, Curitiba/PR)

“... no Filme, assim mesmo, com maiúscula, Cruz e Souza - O Poeta do Desterro, de Sylvio Back, que alia a imagem visual à poesia de uma maneira audaciosa e provocadora.”
Alda Maria Quadros do Couto (Folha do Povo, Campo Grande/MS)

“Pura poesia, o filme soube juntar dois poetas: as palavras do negro Cruz, a estética do branquíssimo Sylvio. (...) Para o amante da poesia de Cruz e Sousa, o filme é puro deleite. (...) O filme é expressionista tal como a poesia de Cruz e Sousa. A leitura de Sylvio Back coloca-o como precursor.”
Zahidé Lupinacci Muzart na introdução ao livro “Broquéis”, de Cruz e Sousa (Editora L&PM, Porto Alegre/RS)

“Dono de extensa obra cinematográfica, o diretor Sylvio Back chega ao ponto mais alto de sua estética com Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro, película que revela o drama existencial do maior poeta negro da língua portuguesa.”
Carlos Adriano (Suplemento Literário de Minas Gerais/MG)

Entrevista com Sylvio Back

Publicada no Suplemento Literário de Minas Gerais, 2001.

Anelito de Oliveira – Como você avalia a recepção tão fria que "Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro" teve no Brasil?

Sylvio Back – Hoje eu sei o que é ser preto no Brasil! Ao tentar reverter a perfídia que permeia o inconsciente coletivo nacional de que Cruz e Sousa teria sido ou seria um "preto de alma branca", meu filme pegou o espectador em geral, e os afro-brasileiros em particular, de surpresa. Os que esperavam hagiografia, um "cinema de lágrimas", um cinema com "negro subserviente", defrontaram-se com um anti-clímax. Isso bastou para "desinteressar", à distância, intuitivamente, parte da mídia e o grande público. O contraste fica por conta da bela fortuna crítica que o filme coleciona. Mas, a bem da verdade, para evitar uma generalização despropositada, em várias sessões especiais dezenas de brancos, negros e mestiços se encantaram, aplaudindo-o de pé com os olhos marejados. Infelizmente, uma ínfima minoria que não se reproduziu quando ele entrou em cartaz. Como resposta – o que venho testemunhando nesses meses de seu lançamento nacional "Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro" acabou (e continua) sendo alvo de um surdo e absurdo boicote, eufemismo que encontrei para definir um preconceito racial, literário e ideológico tão forte quanto o que estigmatizou o poeta em vida e post-mortem. É um filme incômodo porque a sua linguagem incomoda, porque o pré-e-pós onírico da poesia perturbam. Incomodam a platéia acomodada, constrangem e até "ofendem" os cinéfilos viciados no já-visto e digerido.

Oliveira – Que fatores ou fator, enfim, teriam determinado essa reação tão ambígua?

Back – A questão toda, a meu ver, centraliza-se no discurso poético antinaturalista de "Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro" e, sem sombra de dúvida, de como é transmitida a inexcedível amperagem moral da palavra do poeta. Cem anos depois, através do celulóide, ele que adoeceu e morreu quando o cinema brasileiro nascia, Cruz e Sousa é vítima de seus poemas, de sua biografia, é ferido pelas mesmas e vis inveja e discriminação. Era imperdoável pela genialidade, pela ousadia, pelo erotismo, pela poesia que nunca antes ninguém escrevera no país. Segue imperdoável um século depois. E isso se transferiu para o filme. Era quase óbvio que o racismo cordial do brasileiro branquela fosse esnobar a sua cinebiografia, agastado pela radicalidade da narrativa, com o revelar de um poeta único e mediúnico. Não era óbvio que os afro-brasileiros também sucumbissem a reconhecer e absorver as contradições do seu mais forte e vilipendiado ícone. Mas é assim: não interessa um libelo em forma de poema, não interessa cavoucar o inferno da construção da nacionalidade, não interessa olhar-se no espelho da desigualdade e do horror, não interessa um homem igual a todos os homens. A "culpa" é do filme: diálogos em forma de estrofes, o dilema da africanidade do poeta,s interpretações teatralizantes, a descontinuidade episódica, estrutura dramática órfã de emoções baratas, a eleição do verbo e do ethos cortantes – sem mais. No lugar, apenas a imensa e irresgatável dor moral do ser-negro, aquela que se prefere escamotear e deixar como está pra ver como fica. Cruz e Sousa nunca deveria ter existido. "Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro", um filme que não deveria ter sido feito.

Oliveira – Como se dá a estrutura interna do filme utilizando "apenas" os próprios versos e prosa do poeta, ao invés de um roteiro convencional?

Back – Tudo tem a ver como os poemas, textos e cartas fruem e se fazem voz, epiderme, movimento, tato e "olfato" fotográficos, através da linguagem desviante encontrada para o filme. Uma linguagem a contrapelo do cinema clonado de Hollywood e das telenovelas. Entre tantas vertentes que poderiam explicar esse "exílio" do público e de uma certa mídia há uma, porém, onde – penso – reside a chave da incompreensão para o jogo de claros-e-escuros de sua fatura seca e alegórica. Ainda que o passado esteja ali, cronologizado, afinal estamos (será?) nos fins do século XIX, a "estória", narrada de forma tortuosa e elíptica, os cenários, a luz e os personagens se embaralham o tempo todo. E o espectador freqüentemente não consegue enxergar que o filme está na palavra e não numa eventual trama de vivências e ocorrências. A desmetaforização dá-se através da visibilidade pura e simples, que é a própria definição do cinema. Tudo o que é pensado no roteiro tem que se materializar defronte à câmara, mesmo que permaneça invisível. No entanto, em "Cruz e Sousa – O Poeta do Desterro" esse deslocamento ocorre exatamente na formatação dos ambientes (naturais e construídos) e na roupagem que passam ao largo do verismo histórico, para "existirem" na dramatização dos poemas. É a palavra que reina. É a transmutação da poesia em personagem. De versos e estrofes fazendo-se passar por diálogo (quase à moda dos filmes calcados em Shakespeare e dos musicais, mas sem música, apenas com a "orquestração" dos voleios verbais, das inusitadas aliterações – a memória do tantã d'África, dos fonemas e rimas riquíssimos do poeta). Os dados, para não dizer "dardos", estavam lançados. No montar a ilustração cênica e sonora que injetaria de pulsão própria os poemas e no ouvir e ensaiar com os atores – fui orquestrando nas próprias locações a linguagem de um filme que eu nunca havia visto ou feito antes.

Oliveira – Você diria que o filme mostra nossa brasileira dificuldade de ouvir ou uma dificuldade de ouvir especialmente Cruz e Sousa?

Back – Desde o próprio Cruz e Sousa, nenhum dos demais personagens centrais do filme é o protótipo do negro "coitadinho", satanizado pela sociedade branca, pela história oficial. Esse corte epistemológico sobre o que até hoje se convencionou ser o retrato acabado do negro brasileiro provocou uma recusa quase incontornável. Mesmo do espectador dito culto, ele também catecúmeno da chamada "linguagem universal". Porque nenhuma cena, cenário ou figurino reforça a idéia excludente do "negro que sabe o seu lugar". Cruz e Sousa não sabia o seu lugar porque a poesia é a seara do ostracismo da palavra. Meu filme não sabe qual é o seu lugar, É um approach, digamos, ao revés – na ilusão de poder capturar o criador na criatura. Aí está a diferença dele, dos personagens, de Cruz e Sousa, dos atores – atores negros protagonistas num país onde são sempre secundários, vilões, almas heróicas e sofridas, paternalizados, sem pátria, sem futuro, sem história. A sensação de estatura moral do negro torna-se irremediavelmente absoluta no filme. E para quem o assistiu sabe que doravante não se livrará mais da africanidade incandescente e inapagável do maior poeta negro da língua portuguesa. Mas ao mesmo tempo ficará intrigado: será que a cultura "chapa branca" (mesmo aquela vinda das camadas mais humildes jamais é inocente) não o engessou numa homenagem às avessas da escola de samba que o cerca nos derradeiros fotogramas do filme? Ou será que Cruz e Sousa, ou melhor, o ator negro Kadu Carneiro, ao abrir um enorme sorriso para a platéia, não está se vingando dos racistas e sósias étnicos deles, tão algozes quanto no tempo e no espaço? Ou ainda, será que não ficamos todos, inclusive o filme, aquém da compreensão holística do que é ser preto no Brasil?

Mostra de Cinema da Semana Ousada de Artes UFSC-UDESC

25/09, às 14h: “Cruz e Sousa, o poeta do Desterro”, de Sylvio Back
Local: Auditório da Reitoria - UFSC

Sinopse: Biografia do poeta brasileiro, filho de escravos, João da Cruz e Sousa (1861-1898), fundador do Simbolismo no Brasil e considerado o maior po­eta negro da língua portuguesa. Através de trinta e quatro "estrofes visuais", o filme rastreia desde as arrebatadoras paixões do poeta na então Nossa Senhora do Desterro (hoje, Florianópolis (SC)), ao seu emparedamento social, racial e intelectual e trágico fim no Rio de Ja­neiro.

16h
Debate com o diretor Sylvio Back
Local: Auditório da Reitoria - UFSC

"Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro", de Sylvio Back

A Semana Ousada de Artes UFSC-UDESC apresenta:


"Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro", de Sylvio Back

25/09 (quinta-feira), às14h, no Auditório da Reitoria da UFSC (às 16h, haverá um debate com o diretor no mesmo local)

Sinopse
Biografia do poeta brasileiro, filho de escravos, João da Cruz e Sousa (1861-1898), fundador do Simbolismo no Brasil e considerado o maior po¬eta negro da língua portuguesa. Através de trinta e quatro "estrofes visuais", o filme rastreia desde as arrebatadoras paixões do poeta na então Nossa Senhora do Desterro (hoje, Florianópolis (SC), ao seu emparedamento social, racial e intelectual e trágico fim no Rio de Janeiro.

Elenco: Kadu Carneiro, Maria Ceiça, Léa Garcia, Danielle Ornelas, Jaqueline Valdívia, Guilherme Weber, Luigi Cutolo, Carol Xavier, Marcelo Perna, Ricardo Bussy, Jacques Bassetti, Marco Aurélio Borges, Cora Araújo Oestroem, Julie Philippe dos Santos, João Pinheiro.

Ficha técnica:
Pesquisa e roteiro: Sylvio Back
Colaboração: Rodrigo de Haro
Consultores biográficos: Iaponan Soares/Uelinton Farias Alves
Diretor de fotografia: Antonio Luiz Mendes.
Direção de arte: Rodrigo de Haro
Cenografia: Idésio Leal
Figurinos: Lou Hamad
Som direto: Silvio Da-Rin
Pesquisa e direção musical: Silvia Beraldo
Montagem e edição: Francisco Sérgio Moreira
Letreiros: Fernando Pimenta
Direção de produção: César Cavalcanti
Produtores executivos: Sylvio Back/Margit Richter
Produção: Usina de Kyno
Direção: Sylvio Back

Premiação
- Prêmio "Glauber Rocha" de "melhor filme dos três continentes (Ásia, África e América Latina)" e "Menção honrosa" pela "pesquisa de linguagem" da crítica internacional – 29º Festival Internacional de Cinema de Figueira da Foz (Portugal, 2000).
- Convidado dos 2ºs Encontros Internacionais de Cinema de Cabo Verde (2000).
- Convidado para o festival "Brasil em Caracas" pelo Instituto Cultural Brasil-Venezuela (2000).
- Nominação para a categoria de “Melhor Fotografia” (Antonio Luiz Mendes) no Grande Prêmio do Cinema Brasileiro – 2000.
- Convidado para a mostra de cinema brasileiro no Japão (2001).

Curriculum do cineasta-poeta:

Sylvio Back é cineasta, poeta, roteirista e escritor. Filho de imigrantes húngaro e alemã, é natural de Blumenau (SC). Ex-jornalista e crítico de cinema, autodidata, inicia-se na direção cinematográfica em 1962, tendo escrito, realizado e produzido a maioria de seus 35 filmes de curta, média e dez longas-metragens: "Lance Maior" (1968), "A Guerra dos Pe¬lados" (1971), "Ale¬luia, Gretchen" (1976), "Revolução de 30" (1980), "República Gua¬rani" (1982), "Guerra do Bra¬sil" (1987), "Rádio Auriverde" (1991), "Yndio do Brasil" (1995), "Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro" (1999) e "Lost Zweig" (2003).

Tem editados vinte livros - entre poesia, ensaio e os argumentos/roteiros dos filmes "Lance Maior", "Aleluia, Gretchen", "Re¬pública Guarani", "Sete Quedas", "Vida e Sangue de Polaco", "O Auto-Retrato de Bakun", "Guerra do Brasil", "Rádio Auriverde", "Zweig: A Morte em Cena"; "Cruz e Sousa - O Poeta do Desterro" (tetralíngüe), "Lost Zweig" (bilíngüe) e "A Guerra dos Pelados".

Obra poética: "O caderno erótico de Sylvio Back" (Nonada, Minas Gerais, 1986); "Moedas de Luz" (Max Limonad, São Paulo, 1988); "A Vinha do Desejo" (Geração Editorial, SP, 1994); "Yndio do Brasil" (Poemas de Filme) (Nonada, MG, 1995); "boudoir" (7Letras, Rio de Janeiro, 1999), "Eurus" (7Letras, RJ, 2004); "Traduzir é poetar às avessas" (Langston Hughes traduzido) (Editora da Fundação Memorial da América Latina, SP, 2005); "Eurus" bilíngüe (português-inglês) (Íbis Libris, RJ, 2006); "kinopoems" (@-book) (Cronópios Pocket Books, SP, 2006); e "As mulheres gozam pelo ouvido" (Editora Demônio Negro, SP, 2007).

Com 71 láureas nacionais e internacionais, Sylvio Back é um dos mais premiados cineastas do Brasil.